segunda-feira, 26 de março de 2018















A PALAVRA
NUA






Helenice Maria Reis Rocha







ERRÂNCIA



Campos de metal frio habitam
o mar que mora em minha íris
Queria o mundo, tenho a sífilis
fiel equação do amor vadiado
Nestes campos ancoro minha ira
fina fatia de cortante
espera
monstro de esperança vadio
pelos desvãos da palavra
pura errância dos que
não foram, nem
voltaram do imaginário.












A EQUAÇÃO DO VERBO


Versam as fagulhas da fala
na espera das exatidões
Tremulam as oscilações do verbo
na trama do que se diz
no tecido do que se cala
Espero em vão uma sentença de
palavra
não vem
Fala, palavra e verbo são bandeiras
ao vento
à espera dos sentidos.













A EQUAÇÃO DA PALAVRA


Fala palavra!
Sai desse limbo proscrito
de não existência
Aceita seu destino, fala!
Antes de tudo era o verbo
reverso do silêncio
tatuando a mudez das horas
Vejo a face avara das
falas
na procura das estradas
do verbo
na certeza dos caminhos
retos.












MAR DE VERBO



Esculpindo os nãos em
vazios de areias mudas
vejo o solitário percurso
dos silêncios, dos
caminhos de través, das
lembranças.
Desenhando vãos em mar
de verbo traço o destino
da palavra
crio os rumores da
procela.














O DIA


Hoje é o dia
e as suas horas incertas
Vejo o amado
Nas trincheiras das carícias
desperto
O tempo das delícias tatuou
minhas mazelas
lambeu minha pele
devassou minhas esperas.
















AS HORAS


Com lábios de giz mordo as
encarpas do tempo
Meu destino desenhado com lápis
de mares montanhosos, cheios
de misteriosos seres de anis
Meu caminho é um ponto
no imaginário
tatuado de margens
cicatrizado de horas.

















OS SENTIDOS



O fio da procela é o continente
do desejo
mar de ensejos que a todos
devassa
pétalas de vento fazem florir
espelhos
Acariciando a nudez das horas
Vejo seus dedos nas minhas
esperas
fazendo florir sentidos despertos.












A VOZ


Linhas mansas riscam o
papel vazio de palavras
Entre o grito e a fala
passa um rio, tensão
e fria fabulação de verbo
Espero
As linhas são rios que
serpenteiam as falas
ruas da escrita
voz calada.
















A TARDE


Um sol liso chove
sobre os paralelepípedos
desce os desvãos do passeio
escorre pela rua
crua geometria orgânica
iluminando anseios secretos
Labirintos de sentidos
sonhos
Sol, sal, sul
América das esperas
O sol te contempla.














LEMBRANÇAS



Espero a manhã anunciada
No tempo a consagração
das passagens
No vento a consumação
da natureza
Vejo no sol a poeira da
manhã esperada
desataviando lembranças.













SEDE


Uma sede sem cor
desatavia meus brios
e escorre em fios sobre
a lentidão da tarde
Sede que busca saciar um
acordo profundo entre os
homens
Mar de verbo preanuncia a
fabulação de velhos negócios
A humanidade abisma a
gentileza solapada no olhar
agudo de uma fome sem nome
Homens e crianças
sucumbem.












REINVENÇÃO



Não sei de velhas falas
nem da álgebra dos começos
Das origens só tenho o apreço
de nunca as ter esquecido
Sonho o grito solerte
de quem clama dos homens
a justiça
e como um barco à deriva
inauguro um rito —
jamais repetir falas
e sempre reinventar gritos.













VISÃO


Vejo o tempo
como quem navega em
mar de vento mudo
Vejo sempre a cor clara
da Lua caindo em pingos
sobre a rua nua
Vejo o dia como equação
crua de quem sempre
espera a mensagem que tarda
Vejo a noite como geometria
do açoite que sempre manda
avisos tardios.













VELHOS AMIGOS



Mal anunciado dia
antes tão esperado
alvissarando paz e
avisando calma com penetração
de acordos
Hoje, tropeço nas minhas
palavras
meus pares me abandonaram
e seguiram caminhos turvos
Das antigas falas
só a lembrança
Velhos amigos trucidam o
mundo.














DEDOS DE RIOS


Dedos de rios voando rasteiro
sobre a Terra
serpenteando o chão
batizam os desvãos de Minas
Rios são linhas de água
batizando a sede
Anunciando nomes
Dedos de rios são bênçãos
bendizendo o mundo.














LÍRIOS


Das fendas do seu não
florescem lírios para
florir minhas esperas
Esperei o namorado na
janela
o afago amigo
o pé da letra
Hoje, recolho do seu não o
meu ofertório de lírios
florindo solertes nas
minhas mãos.














AS RUAS DO TEMPO


Ruas são braços nus sobre a
Terra
riscando o espaço como sentenças
nuas
Sobre o destino das ruas
podem os engenheiros do
tempo construindo céleres
os negócios imobiliários
Matam as ruas e o tempo
inventando novos desalentos
em ócios industriais.












LOUCOS



As falas saltam como árvores
descabeladas nos lábios dos loucos
Tão belas as falas dos loucos
Toda a ferocidade do erro
triturando a fealdade
da lógica
A quem pertence a razão?
Aos loucos
Aos que vêm o mundo
por detrás
Aos que sonham detrás
dos porões.













O VENTRE DA CIDADE



A cidade tem um ventre
de fogo
ardendo nas oscilações do
pregão
queimando nas duras mãos
dos homens de negócio
triturando vísceras em máquinas
incandescentes
Vejo os olhos líquidos das crianças
se desmanchando em sangue
e o ventre da cidade
devorando braços.












O OVO


Banal como um ovo de papel
os olhos agudos do mendigo
batizam mar de indiferença
e todo o mal que o mundo
encerra conspira nessa aparente
banalidade.
Vejo a cidade, densa
Lamento a fome, a doença
Ergo do fundo das entranhas a
minha ira
E proclamo:
Aos céus, o catarro do mundo.












BALANÇO



O suor da noite escorre
nestas palavras
varadas de majestade e
mansidão
É que muito me orgulho dos
dias passados
Fui leal aos amigos
Cortejei amores antigos
Desconheci ingratidões
Abracei desconhecidos
Beijei os mais declarados avisos
Meu coração, um oceano de
alvíssaras.










AS BELAS



Um oceano de cismas me
invade
Entre rimas indecisas e o
turvo rumo dos caminhos meu
coração oscila
Lá embaixo, a cidade
tumba-vivenda de homens-fera
na feracidade dos dias
Soldados ferem crianças nas valas
e a cidade sangra
escoa ao rumor das balas nos
recantos sombrios das favelas
Belas bailam nos clubes da
cidade.










SAUDADE



A tua ausência é uma
palavra sem asas
esculpe vãos no meu siso
é como aviso de fim
caminha nos meus flancos
como chamado sem resposta
esculpindo nãos na minha
carne
confundindo minhas apostas
A tua ausência é uma falta
mansa
inaugurando um desejo
proclamando sentenças.













AS PORTAS


Se a porta é estreita meu
ventre não passa
Prefiro as portas largas e
generosas das igrejas
e a companhia dos anjos
os anos do tempo que virá
Entrarão nestas portas os
mendigos e as putas, sem
pedir licença
se abancando
marcando presença
— Qui tá Benedito, sinhô!











O TEMPO


Os anéis do tempo perpassam
minha memória
Ouço gritos nos porões
Vejo sangue nas estradas
Hoje, trago no peito uma
certeza clara
desses gritos nasceram cantos
desse sangue jorrarão flores
porque foram meus companheiros
que deixaram seus pedaços
pelos caminhos
para eu colher essas flores
que sangraram.











AQUELA RUA


Aquela rua era como um
pássaro risonho
serpenteando as nesgas do
tempo na memória
Tinha vendedores ambulantes
lojas de tecidos
crianças
Aquela rua era a alegria
nua bailando mansa
sob o meu olhar
Aquela rua continua andando
na minha secreta fabulação
dos dias que virão.












A DANÇA DO TEMPO



Os dedos do tempo escorrem
lisos sobre as horas nuas
chamando os que se atrasam
nos desvãos do percurso
acariciando como presença crua
os que se perdem nas armadilhas
do verbo.
O tempo, sem palavras, apenas
marca o compasso
desenhando passos em palavras
mudas









TUDO O QUE VIVE



Carneiros de voz
pulam sobre as
ruas
ondeando a calma nua
bailando sob o sol da
tarde
São crianças
são mulheres
são homens
lembrando que tudo
vive
e fala.












NUDEZ


Entrego minha nudez
preclara
aos estandartes da devoração
anunciando a emoção do verbo
nos rios de palavras mansas
que correm nos desvãos das falas
Canto a anunciação
tecendo valas em sentidos
claros
entoando sons em alaridos
mudos.
Entrego minha nudez aos fortes
e mansos.












SIM


Declaro ao fim do dia o
anúncio dos começos
o avesso da procela
o início da consumação
modulando o tom da fala
e contando o ofício das
histórias
naquilo que nunca foi contado
Alerta, espero
a falência de todos os nãos.













AS PALAVRAS


O ruído das palavras
tatua os sentidos e
se faz árvore florescendo
as denominações
A cor do verbo dança nas raízes
das falas declarando guerra
anunciando paz
Os homens rezam
discursam
cantam nos jograis
os rituais falados
e quando sobe um grito na garganta,
se calam.













AS ESTAÇÕES



Minha humanidade é um riso seco
atravessando as horas
devassando o tempo
desnudando a calma superfície
das coisas
Pergunto ao já sabido o frio
exercício das denominações
e sigo, cansada
o ritmo das estações.














ESPERAS


Uma passarela de amavios baila
entre mim e o sonho
Estendendo um lençol de
risos nos rios do tempo
Antes, bailava sem aviso entre
feridas e riscos vendo carícias
na dor
Hoje, fabulo os artesãos do
amor entre os homens
construo esperas
e descanso nelas.













A ESPERANÇA


Um mercador da palavra
seduz multidões
encantando os homens
adormecendo a cidade
e vende a voz a qualquer preço
comerciando sentidos
vendendo esperança
nos palcos, nas valas
nas praças, nas salas
O mercador da voz
comove
vendendo esperança
a qualquer preço.














OS NAVEGANTES


Vejo a tribuna dos
navegantes
viajando solenemente em
mar de tempo
Julgando causas perdidas
mordendo o vento
bailando rios de avisos
fabulando alentos.













A SENTENÇA DA TARDE



Tiro do armário as
velhas alpercatas
fabulo chamados
converso com os vizinhos
A rua desfila uma tarde
intacta
O sol parado pelo grito
dos meninos
Ninguém me tira esse
poder que a tarde me dá
Nem as minhas ânsias adiadas
Nem doença de tia.












O PODER DAS RUAS


As ruas são estandarte do dia
hora cheias, hora frias
serpenteando braços e
pernas em mar de gente
escondem risos, escondem
delírios
em vitrines nuas em
clamor de vozes
As ruas são vida e anti-vida
entre homens de gravata
e crianças cruas.









BATALHÃO DE CHOQUE


As ruas suam olores de
mar de gente
sangram horrores de crianças
nuas
no buliço da tarde
são risos, são gritos
é o tropel difuso de
botas policiais
Um menininho roubou
uma velhinha
cruel equação dos começos
e dos fins
Um batalhão de choque
cerca a avenida.











A FALA


A fala é como uma chuva
que cai
em tempo e hora datadas
trazendo fabulações várias
fazendo vala em silêncio
de verbo
A fala flutua nas salas
como rio, hora manso, hora
bravo
trazendo histórias
declarando nadas.












AS VALAS


Proclamo às paredes nuas o
meu ofício
Esse de buscar as palavras
em vãos de nada
de inventar falas
e torná-las claras
De explicitar a fina tensão
do verbo levantando um
vôo de águia
sobre a voz das valas.














OS ESPELHOS


A fiel equação do desejo
inventaria falas
inaugura esperas
proclama a solerte
nudez das horas
quisera ser a tensão de
todos os ensejos
o sonho proclamado em
praça pública
a exatidão dos espelhos.












DIA NU


A palavra é um carro vazio
navegando mansa em avenidas
de sentidos
flutuando lassa em rios de voz
proclamando a nudez do verbo
declarando avisos.
A palavra corre como um
dia nu pelos desvãos
das horas
subterrânea equação dos
desencontros
elogio solene dos muito sós.













MEU PAI


Aquele dia era como uma
canoa sem asas
Meu pai morto
A equação do abraço
Lembro-me de todos os rostos
da lágrima engolida
a saudade
Hoje, tenho do meu pai morto
a reduzida geometria das horas
A nua lembrança
A memória.














A CALMA DAS HORAS


O canto da minha mãe
transborda as ruas da
minha memória
singular e calma voz
do passado
num colo manso em dia de
sol.
Hoje, do tempo guardo as vísceras
da calma, as horas.
















OS MINUTOS


Os minutos piscam no ventre
do tempo
chamando os esquecidos olhares
das horas
bailando sobre os humores
dos momentos
atravessando a barca da
memória.

















OS LIVROS


Carneiros de letras dançam
nos livros
repetindo velhos sentidos
O carmim das horas atravessa
o papel colorindo a
dança do tempo
Livros são memória varando
a sentença dos minutos
declarando presença.










AS FRESTAS


Toda benzedeira devia
se chamar Ana
como todo o sol devia
entrar pelas frestas
Espero os dias de festas
e bendigo as procissões
o carnaval, não me abalo
Depois virá a quaresma.
a páscoa
a viração
O balanço dos dias
me embala.
como massa de pão em
fogo brando.












O DESVARIO DAS PALAVRAS



Penetro o humor das
falas
fabulando mitos
conspirando as horas
Nenhum amor me consola
nem mesmo o maldito
erro do passado
Sou sábia
e vivo o tumultuário
desvario das palavras.

















O RUMO DAS HORAS


Nos jornais, notícias
Nos sulcos das palavras
a vária evolução dos sentidos
Espero a sua sentença
nos desvãos do meu gemido
e escrevo a branca
mutação das horas.

















MEMÓRIA


Bailo sobre o fino trapézio
das linhas do verbo
reverberando sentidos
Vejo à sombra do
meu ventre o riso
ambíguo das horas
e vou
muda
sorvendo o tempo
como tecelã da memória.
















O SONO


Entre clarins de nada
solto o primeiro suspiro
Entre os mandarins da palavra
caminho sem rumo
Entre os ritmos das falas
busco a palavra
Entre os desvarios do sono
entrego o meu abandono.

















DRAMAS


A Lua muda atavia a noite
desatando os nós do tempo
avisando anúncios de
devoração
Antes só a dança dos momentos
me servia de aconchego
Hoje, debaixo da Lua nua
teço enredos
desatavio dramas.
















O REGAÇO DAS TARDES


Tarde ardendo inabalável
sob mar de vento
invade meu desalento
ferindo meus cernes
tatuando o tempo de
declarados avisos
batizando o riso das
esperas
Ancoro meu verbo no
colo das tardes.














O VERBO


Vou por onde me desanimam
os avisos
destecendo o siso
embaralhando as cartas
Vou aonde se desalinham
os risos
desentranhando falas
ataviando o verbo.


















AS FACES DAS PALAVRAS


A nudez da fala me
desacredita.
Perfilo as valas do tempo
prefiguro ritos
desvestindo o verbo da
sua voltagem
inaugurando a calma
voragem
das palavras.















O PASSADO DO FUTURO


Vejo o futuro no antes
quando as garras do
tempo inauguram ritos
e a saudade é o instante
do fim
Vejo algures nos prantos
quando se chora o vivido
Quando o que chama, ri.















MEUS GRITOS


A travessia entre as falas e
as valas
é a nudez do tempo
face a vara dos silêncios surdos
que as horas insistem em
atravessar
Ancorei meus gritos surdos
nesse momento
no meio do caminho
entre
desalinhando os passos do antes
desenrolando a linha do depois.













ANDAR


Ainda as ruas desataviando
meus brios
Hei de andar nua nelas
a desoras
perseguindo o silêncio dos aflitos
entorpecendo os meus gritos
com o rumor das horas
Ainda as ruas, cruas
desanuviando os meus brios.















A MANHÃ


O dia da anunciação passou
solenemente
entre risos da guarda
entre gritos de silêncio
carregando a bandeira do dia
declarando presença
A anunciada manhã se faz
em si
trazendo o sol das horas.















MANSIDÃO


A nervura do dia penetra em
mim mansamente
hoje eu sou o sol
amanhã, já não sei
talvez a sombra
O gozo das estações me
deslumbra
como quem pede vésperas
Sou mansa
e espero sempre uma festa.















AMANHÃ


Amanhã serei tão somente
o resto dos dias de hoje
a sentença
o tremor dos lábios
Espero poder sorrir calada
o costumeiro sorriso
dos sábios
com lábios de calmaria
com olhar de vento.
















AS PEDRAS


Tiro das vértebras o matiz da
palavra
como de resto toda a consumação
do verbo
Vesperal batismo das incertezas
batizo as falas com meu sentido
das alertas
ceifando o verniz
proclamando asperezas
tiro do verbo o granito das pedras.













A BUSCA


Apenas um sentido me comove
o da nudez
com sua avareza de ornatos
Somente um gemido me desperta
o das crianças
com sua urgência e recato
Ainda que a nudez não fosse avara
e que o gemido não fosse um só
busco tão somente a equação
das vésperas
e a urgência de todas as esperas.















OFERTÓRIO


Recebo esse amor tanto
esperado
como quem proclama alvíssaras
Do grito antigo guardo
a ferida alerta
Da palavra mal dita guardo
a expressão incerta
Atravessei turvos caminhos
como quem beija crianças.
Hoje, tenho apenas um sorriso
e o meu ofertório.













JUÍZO


Tirando vísceras das pedras
formulo o verso
reverso das minhas esperas

Tirando vícios das esperas
formulo o verbo
capricho das valas

Tirando carícias das feras
bailo o meu sizo
escasso juízo de bela.














DÚVIDA


As flores, e sua exata designação
da beleza, não me comovem
A sua fácil aceitação
me desespera
Fácil é ser bela
Me comove, antes, a feia indecisão
dos tímidos
a estranha paixão dos feios,
daqueles que não encontram
um lugar nos jardins.
















CONFIRMAÇÃO


Sulcos de voz riscam minha
fala
batizada de senões
banhada de esperas
quem dera fosse nos desvãos
das palavras o país de
todas as certezas
Nenhuma sentença falada
confirma minhas asperezas
Nenhuma confirmação me abala.















CRIANÇAS


Vejo os olhos das avenidas
nos meninos
nas mulheres
na vida que baila nas
ruas da cidade
Sinto o olor das ruas
na pele
e o grito das crianças
nas vísceras.















A SENTENÇA DAS RUAS


Uma coreografia nua me
atravessa a retina
no som do bailado das
ruas
nas curvas das avenidas
ouço buzinas
e risos
ouço passos
sinto o alarido
vejo crianças nuas
riscando meu olhar cansado.















QUEM SOU


Em vias transversas ancoram
minhas porfias
atravessam minhas incertezas
descansam minhas falas, meus
risos.
Sou apenas um anúncio dos
começos
Um sinal dos avessos
Uma reveria.

















O QUE VALE


Começou o anúncio dos fins
o grito nas esquinas
o desarranjo nos rins
As entranhas se desconcertam
a vida não vale um
apreço
Os homens desataviam os
começos
Vale o grito e o avesso.

















MEU CORAÇÃO


Meu coração pede ausência de
palavras
despreza a viagem do verbo nas
minhas retinas
Minhas noites são calmas
Sinto a ira dos desnudados
e a paz, bailando branca sobre
meus versos
Não tenho alma.
















A CLAREZA DAS HORAS


Nunca vi a clareza das horas
ou o ritmo das falas
mas as palavras batizam, claras
os meus lábios vazios
sempre que grito
sempre que choro ou rio
proferindo sentenças
ou
proclamando ritos.

















MONTANHAS


O redemoinho das falas
batizou o vento nas montanhas
de minas
Mar de palavras
alimentou conspiração e murmúrios
gozo e sedução
pela trilha das valas
Amamos o verbo
as proclamações.















SENTENÇAS


Arranco da nudez a sentença
urgente
Quero a voz emudecida
a palavra seca na garganta
o grito
arrebentando correntes
ferindo séculos
Quero a palavra gritando
ferindo a epiderme do tempo.
















A SENTENÇA DA TARDE


Lençóis ondulam lentamente
nos varais
a voz da tarde me comove
audição de silêncio e de
calma
espero dessa voz a sentença
e dos minutos a consumação
das horas
Os dedos da tarde me embalam
Como quem sorri e
Cala.













A BARCA DAS HORAS


A barca das horas carrega os
homens na sua proclamação
de limite
Embarcação de falas, risos,
esperanças, feita de recuos
e avisos.
O tempo baila sisos
respingando o olor das horas.
Por uma sentença de sonho recuo
no tempo
Vejo palavras, verbo em
movimento, alguma dor e alento.











OS RIOS


Penso nos rios como quem
desenha voltas riscando
ao acaso o papel
Dentes de vento mordendo
as águas, moendo o tempo
nos corações
Penso no mar como quem sonha
vésperas de chegada
e fabulo dos rios e dos
mares a graça
Conheço tão somente a
placidez das praças
e a mordida do sol da
tarde.














LAPIDAÇÃO


Recuso a minha dor porque
a poesia assim exige
sufoco o meu grito num
verso de calma
Não é da dor a matéria dos
meus versos mas da lapidação
exata que o verbo exalta.
















A TRITURAÇÃO DO VERBO


Como cimento moído trituro
o verbo extraindo das palavras
o suco
Tão fugidias as palavras
escapam como água escorrendo,
serpenteando caminhos de
sentidos
Triturando o verso que foge
esculpo avisos
alvissarando o
amanhã do reverso
as entranhas do poema fecundando
as avenidas.












AVISO


O destino morde as vísceras
dos que fogem dele
aparecendo nu nas esquinas
batizando as fendas da
noite
Não há desatino que resista
à exata medida das
virações
nem aviso que não acaricie
o rumo desvairado das
pretensões.








Í N D I C E

ERRÂNCIA ...................................................................................................... 1
A EQUAÇÃO DO VERBO ............................................................................... 2
A EQUAÇÃO DA PALAVRA ........................................................................... 3
MAR DE VERBO ............................................................................................ 4
O DIA .............................................................................................................. 5
AS HORAS ..................................................................................................... 6
OS SENTIDOS ................................................................................................ 7
A VOZ ............................................................................................................. 8
A TARDE ........................................................................................................ 9
LEMBRANÇAS ............................................................................................... 10
SEDE .............................................................................................................. 11
REINVENÇÃO ................................................................................................ 12
VISÃO ............................................................................................................. 13
VELHOS AMIGOS .......................................................................................... 14
DEDOS DE RIOS ........................................................................................... 15
LÍRIOS ............................................................................................................ 16
AS RUAS DO TEMPO ................................................................................... 17
LOUCOS ........................................................................................................ 18
O VENTRE DA CIDADE ................................................................................ 19
O OVO ........................................................................................................... 20
BALANÇO ..................................................................................................... 21
AS BELAS ..................................................................................................... 22
SAUDADE ..................................................................................................... 23
AS PORTAS .................................................................................................. 24
O TEMPO ...................................................................................................... 25
AQUELA RUA ............................................................................................... 26
A DANÇA DO TEMPO .................................................................................. 27
TUDO O QUE VIVE ...................................................................................... 28
NUDEZ .......................................................................................................... 29
SIM ................................................................................................................ 30
AS PALAVRAS .............................................................................................. 31
AS ESTAÇÕES ............................................................................................. 32


ESPERAS ...................................................................................................... 33
A ESPERANÇA ............................................................................................. 34
OS NAVEGANTES ........................................................................................ 35
A SENTENÇA DA TARDE ............................................................................. 36
O PODER DAS RUAS ................................................................................... 37
BATALHÃO DE CHOQUE ............................................................................. 38
A FALA ........................................................................................................... 39
AS VALAS ...................................................................................................... 40
OS ESPELHOS .............................................................................................. 41
DIA NU ........................................................................................................... 42
MEU PAI ......................................................................................................... 43
A CALMA DAS HORAS ................................................................................. 44
OS MINUTOS ................................................................................................. 45
OS LIVROS .................................................................................................... 46
AS ARESTAS ................................................................................................. 47
O DESVARIO DAS PALAVRAS ..................................................................... 48
O RUMO DAS HORAS ................................................................................... 49
MEMÓRIA ....................................................................................................... 50
O SONO ......................................................................................................... 51
DRAMAS ........................................................................................................ 52
O REGAÇO DAS TARDES ............................................................................ 53
O VERBO ....................................................................................................... 54
AS FACES DAS PALAVRAS ......................................................................... 55
O PASSADO DO FUTURO ............................................................................ 56
MEUS GRITOS .............................................................................................. 57
ANDAR .......................................................................................................... 58
A MANHÃ ....................................................................................................... 59
MANSIDÃO .................................................................................................... 60
AMANHÃ ........................................................................................................ 61
AS PEDRAS ................................................................................................... 62
A BUSCA ........................................................................................................ 63
OFERTÓRIO .................................................................................................. 64
JUÍZO ............................................................................................................. 65
DÚVIDA ......................................................................................................... 66


CONFIRMAÇÃO ............................................................................................ 67
CRIANÇAS .................................................................................................... 68
A SENTENÇA DAS RUAS ............................................................................ 69
QUEM SOU ................................................................................................... 70
O QUE VALE ................................................................................................. 71
MEU CORAÇÃO ............................................................................................ 72
A CLAREZA DAS HORAS ............................................................................. 73
MONTANHAS ................................................................................................ 74
SENTENÇAS ................................................................................................. 75
A SENTENÇA DA TARDE ............................................................................. 76
A BARCA DAS HORAS ................................................................................. 77
OS RIOS ........................................................................................................ 78
LAPIDAÇÃO .................................................................................................. 79
A TRITURAÇÃO DO VERBO ........................................................................ 80
AVISO ............................................................................................................ 81


Nenhum comentário:

Postar um comentário